Agroecologia, conhecimento tradicional.

Uma introdução à Agricultura Moderna.

SAFNão faz muito tempo a agricultura orgânica era a única forma de cultivo existente. Não existiam grandes máquinas, sementes transgênicas ou agrotóxicos atuando no campo. Existia apenas a força do trabalhador e o conhecimento ancestral que este carrega.

Porém, com o final da segunda grande guerra, a indústria bélica se viu obrigada a redirecionar seus esforços para outro mercado. A implantação de suas máquinas na agricultura e pecuária era uma necessidade para a continuidade dos lucros.

Outros produtos usados na guerra do Vietnã acabaram se tornando presentes em pouco tempo. O agente laranja, uma substância que causava a morte das florestas e tornava visível os plantéis inimigos, deu inspiração ao Round up, produto muito usado até os dias de hoje para limpeza dos campos e plantas indesejadas.

Ou seja, aos poucos, em todo o mundo, a agricultura moderna encorporou a indústria da guerra em seu modelo de cultivo e manejo. A relação entre o homem e a natureza se tornou uma relação ostensiva baseada na brutalidade e no extermínio.

A guerra contra a natureza extinguiu muitos dos conhecimentos tradicionais dos povos camponeses. A chegada do modelo agroindustrial expulsou os pequenos agricultores e suas famílias do campo.

Não era mais necessário que houvessem muitos trabalhadores para cuidar de grandes extensões de terra. Assim, muitos grupos empresariais e grandes fazendeiros aumentaram suas propriedades. Enquanto agricultores familiares vendiam suas terras e imigravam para grandes cidades. Com o baixo preço dos alimentos produzidos pelo agronegócio a agricultura passou a dar menos retorno financeiro. Para os pequenos, se tornou uma profissão inviável.

exodo-rural-causas-e-consequenciasA migração para as cidades teve um grande crescimento nas últimas décadas do século XX devido ao avanço da agroindústria no campo. Cada vez mais, empresas superpoderas desbravavam e dominavam os rincões do planeta. O aumento desordenado da população urbana trouxe para as cidades altos indíces de violência e pobreza. Estava se desenhando nosso cenário atual.

 

A virada agroecológica.

A crise hídrica e climática que enfrentamos hoje é resultante, principalmente, da devastação das florestas e consequente extinção da biodiversidade. A má gestão dos resíduos sólidos e orgânicos, e o despejo in natura de esgoto no leito dos rios é um agravante a este cenário.

Com esse panorama, o interesse pelo conhecimento tradicional da agricultura sustentável veio à tona. A ecologia começa a tomar papel importante na existência humana. Ou aprendemos a gerir os recursos (econômicos, ecológicos e sociais) de maneira sustentável, ou colocaremos em risco a sobrevivência saúdavel das futuras gerações.

brocólis e alfaceA Agroecologia nasceu, portanto, com essa missão. Resgatar os conhecimentos tradicionais e ancestrais, fortalecendo e recriando relações sustentáveis de gestão dos recursos naturais. Uma ciência que propõe uma mudança nos padrões de produção e consumo da nossa sociedade industrial.

A palavra agroecologia foi utilizada pela primeira vez em 1928 com a publicação do termo pelo agrônomo russo Basil Bensin.

O entendimento da agroecologia enquanto ciência coincidiu com a maior preocupação pela preservação dos recursos naturais nos anos 1960 e anos 1970. Os critérios de sustentabilidade nortearam as discussões sobre uma agricultura sustentável, que garantisse a preservação do solo, dos recursos hídricos, da vida silvestre e dos ecossistemas naturais, ao mesmo tempo que assegurasse a soberania alimentar.

A agroecologia é ainda uma ciência e uma prática em franca expansão. A partir dos anos 1980, as organizações não governamentais, ecovilas e comunidades tradicionais foram fundamentais na promoção e divulgação da agroecologia em todo o mundo e especialmente no Brasil.

“A abordagem agroecológica propõe mudanças profundas nos sistemas e nas formas de produção. Na base dessa mudança está a filosofia de se produzir de acordo com as leis e as dinâmicas que regem os ecossistemas – uma produção com (e não contra) a natureza. Propõe, portanto, novas formas de apropriação dos recursos naturais que devem se materializar em estratégias e tecnologias condizentes com a filosofia-base” Ivani Guterres.

A agroecóloga brasileira Ana Maria Primavesi, reforça em suas teses o laço que deve existir entre o fazer agroecológico e o saber tradicional e popular:

manejo florestal“A Ecologia se refere ao sistema natural de cada local, envolvendo o solo, o clima, os seres vivos, bem como as interrelações entre esses três componentes. Trabalhar ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando a teia da vida. Sempre que os manejos agrícolas são realizados conforme as características locais do ambiente, alterando-as o mínimo possível, o potencial natural dos solos é aproveitado. Por essa razão, a Agroecologia depende muito da sabedoria de cada agricultor desenvolvida a partir de suas experiências e observações locais.”

 

Princípios e técnicas agroecológicas.

A Agroecologia consiste em uma proposta alternativa de agricultura familiar que agrega saberes populares e tradicionais aos conhecimentos científicos das ciências naturais e sociais. 

Possui em sua essência a integração de todos os saberes e ciências em busca de um conhecimento profundo e integrado sobre os diversos ecossistemas da natureza. O objetivo da agricultura ecológica é respeitar ao máximo a sustentabilidade dos ciclos naturais em integração com a agricultura produtiva. Produzindo alimentos variados que enriqueçam o solo sem o auxílio de insumos químicos ou agrotóxicos.

A agroecologia condena a alta mecanização do campo, assim como a concentração de terras produtivas, a exploração e exposição do trabalhador rural aos venenos e agrotoxinas. Acredita que a valorização do campônes é fundamental para a fixação do homem no campo e para manutenção de um meio de vida sustentável.

flor do brocólisAs práticas agroecológicas podem ser vistas como práticas de resistência da agricultura familiar perante o processo de exclusão no meio rural e de homogeneização das paisagens de cultivo. Essas práticas se baseiam na pequena propriedade, na força de trabalho familiar, em sistemas produtivos complexos e diversos, adaptados às condições locais e ligados a redes regionais de produção e distribuição de alimentos.

Suas principais técnicas de cultivo são a compostagem orgânica, a adubação verde, a conservação do solo através da cobertura vegetal e o uso de caldas naturais na defesa agrícola. Os sistemas rotacionais são fundamentais para regeneração do ciclo produtivo da terra e para o crescimento de plantas sadias e resistentes a pragas e doenças.

A conservação das sementes Crioulas (que são as sementes livres de pesticidas e não transgênicas) que foram tradicionalmente selecionadas e armazenadas ao longo de séculos pelos povos camponeses também é fundamental para a autonomia do agricultor frente às patentes de sementes dos laboratórios.

(Continua…)

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